terça-feira, 15 de outubro de 2013

    A gente veste o mundo com palavras. E pra isso cada um usa a roupa que tem, que precisa. Agora..., quando se deixa o mundo nu o que se vê é um tudo misturado, não separado. Cada um encontra uma parte do mundo pra vestir com as palavras, criando um vício de querer o mundo assim, vestido com as roupas. De início a gente fazia isso pra adorar mais ainda o mundo, depois virou necessidade e depois mania. Daí, alguns - já alguns - começaram a vestir o mundo a partir do que percebiam que era possível ser visto como separado, isso para mostrar aos outros alguns o que tinha percebido de detalhe no meio daquele tanto de tudo. Isso separou a gente do mundo, ficamos mais com as palavras, um mundo de palavras. Mas, quando fazemos silêncio, quando tiramos as palavras das nossas cabeças, a gente revê o mundo pelado, escapando por todos os lados e daí podemos novamente nos sentir dentro dele e - com ainda mais silêncio - lembramos que também somos ele... shhh... chega de tanta palavra...
     Quero acordar cedo amanhã, varrer o chão desse quarto que nunca foi varrido, botar o óculos de grau só pra fingir miopias, ler a sorte no jornal, passar a camisa em cima da pia. E se amanhecer chuvoso, recolher as roupas do varal pingando sentindo saudades do sol e ficarei pelado, sem medo de ficar molhado, com as costas nuas depois farei um chá quente e escreverei um texto para um grande amigo meu, um texto sem mentiras, o primeiro depois de muito tempo que não quer ensinar nada, nem quer julgar, nem terá problemáticas complexas e nem sugerirá caminhos. Será um texto de dentro, sem intenções de elogios, vazio de maldades, um texto que não quer a resposta, e não conterá nenhuma novidade. E mesmo assim ele fará bem, porque vou por nele palavras tão desvencilhadas de complicações que elas parecerão o perfume de um alecrim.
     Amanhã quero encontrar os confusos e dizer que a confusão deles é uma beleza, amanhã quero tomar conta de menos coisa possível pra ver se uma coisa inédita me toma a atenção, pra acrescentar e me embaraçar ainda mais nas quinhentas paixões que se enroscam dentro de mim. Amanhã quero acordar cedo, ler esse texto e ver o que ele sugere pra mim.


quinta-feira, 10 de outubro de 2013

e provável provavelmente
ele pode ser um ali
entre nós
roguemos então
abre aspas
que o círculo se abra
fecha parênteses
e saia daqui
sem direção
à contramão
e se diga
"eu sou um pássaro
e quero voar num papel
em um poema"
virgem de planos
vindos de mim,
escrevendo.

um exagerozinho

Percebi que já estava contaminado
fui, então, decidido, pedir mais cuidado
respondeu que eu estava afobado
lhe escrevi, então, angustiado:

Mesmo dentro de um navio agitado
pularia à bordo levando meus potes encantados
dançaríamos em tempos desritmados
guiaríamos entre as ondas pra outros lados
onde o mar folgado já não está tão bravo
e tiraríamos dali, em terra, um tempo de resguardo
casaríamos nossos corpos cansados e machucados
num sereno doce profundo e aconchegado.

E você se esvai - como tudo - e vai pra outro lado
fico ainda um tempo parado
tentando pescar a garrafa que bóia enrolado um recado
passo ali na ilha calado
breve momento de luto sagrado
por um dia ter em mim desaguado
navio tão doce de casco dourado
bulbo riscado, prumo arranhado
velas abertas, vento soprado
rumo à mares pouco navegados.

Em poucos dias acho tudo engraçado
e faço numa espécie de descarrego rimado
versos ingênuos, de manhã, logo após ter acordado
e discuto comigo se serão entregues ou amassados
rasgados, jogados... dobrado, guardados
e como sentimento algum gosta de ser travado
concluo comigo:
- Entregue logo, aliviado!

Não encontrei onde tinha falhado
talvez, simplesmente, não tenhamos funcionado
ou, talvez, nem sequer tenhamos começado
novamente fui ponte
entre o passado e um novo namorado.