sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

Conversão

Estava – aquele sujeito – sujeito, de novo, ao novo. Assobiava um canto no canto da sala de recepção pensando na nova descoberta: “Se estivesse em outro lugar, mesmo tendo a mesma forma, seria outro”. Quando o porteiro – soldado – marcou, correu pro elevador. Entrou no corredor em segundos, andou até o segundo andar e bateu no quarto quarto. Ninguém estava, arrombou e caminhou até a caminha que ainda chamava as piras que alimentara por tantos meses a chama da pira. “O último encontro que tivemos foi o último”, decidiu. Cravou no colchão um cravo e uma rosa rosa-claro onde encontrou um cheiroso bilhete. Não era seu. Leu. No verso dos versos, viu dois nomes: Ligia versus Mauro. Bordados por um coração de caneta vermelha. “Cobra!”
Nunca, ou – sem extremarmos – jamais, no passado ou presente havia pensado em presentear aquela garota com algo tão presencial e marcante. Sempre, por todo o tempo, a cada instante sem exceção, em tudo que fizera, fora amarga sua docilidade. E agora o que lhe restava era a parte não consumida, não a sobra, mas o que desprezaram quando não escolheram depois de cobrado.
Saiu bufando, rasgando a grama alta, o mato. “O mato”. Há horas perdera o almoço, tonteava. Pra subir a pressão, comprou um doce, quando deu com o inapetite: “como como?”. Pensava no primeiro encontro: num ônibus, aquela menininha de sardinhas soando naquela lata de sardinha, de saia, ele saindo da hora do almoço, com a manga toda suja de manga – não poupou nem a polpa – desgrenhado, coçou o papo mal tosquiado, ensaiou e aventurou um papo: “Opa!”, “Oi”, ela respondeu. Jogou o suspiro, suspirou, pediu um suco. No balcão do boteco, uma traça cinzenta traçava um traço torto num guardanapo sujo. Mais devagar no ódio, concluiu que estaria surtando: “Todos são tão sãos e eu despertando um acordo adormecido, enganchado numa coisa que já não existe há quinze anos.” E quando ele se viu, só se viu. Abismo, babou. Bem no meio da afobação arranjou um meio de sair dela:
Nunca contou, a ninguém, que contou a terça parte de sua parede central e lá pregou um terço sem ninguém precisar lhe pregar uma grama. O sol de caminhão, de monte, montado em cima de um monte de montes montados pelos arranha-céus espremidos, se via da sacada. Sacou: a vida, uma arma! E nunca mais orou, nem por dentro nem pra fora.

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